segunda-feira, março 19, 2012

✽ Últimas Vezes

Às vezes olhar pra trás é muito doído. Meditar no passado é assim, uma mistura de saudade e nostalgia doída de não poder voltar o tempo. É um nó na garganta de ter se distanciado do que era tão familiar. É aquela sensação inconclusiva de amor mal-resolvido. O tempo passa tão desapercebido que a gente nem deu adeus. Pode ser que seja porque eu sou uma sentimental, mas acho que há algo agudamente melancólico nisso.

O passado é aquele filme que a gente protagonizou mas hoje assiste da platéia. Ao tentar relembrá-lo, a memória tantas vezes nos escapa; são apenas flashbacks de uma infância sensível; breves cenas engavetadas na mente a nos sussurrar de onde viemos. A memória são restos de vida desconfiáveis; já nem se sabe mais o que de fato aconteceu e o que a nossa mente inventou. Nos trai a memória. O passado é cheio de gente que já não existe mais, porque essa gente se metamorfizou lentamente com o tempo deixando de ser quem era; quando nos piores casos não nos deixam de fato, pra viver distante ou não mais viver. Ele é cheio de cenas e lugares que nunca mais serão os mesmo. São bons amigos que hoje são estranhos e melhores amigos que, com otimismo, nós saúdam feliz aniversário uma vez ao ano. A vida morre aos poucos sem a gente saber.

Ninguém conta pra gente que um dia, drasticamente, olharemos pra trás e nada mais será o mesmo. Despreparados estamos todos nós. Não foi dado aviso ou sequer um momento lúcido e definitivo pra dizer adeus. Foram-se pessoas, lugares, estações da vida e suas particularidades, sem dar tempo de nos despedir. Cruelmente, assim, sem mais nem menos, foi a última vez e eu não soube. Últimas vezes são pequenas mortes.

Certa vez um grande amigo me falou, alguns meses depois de eu ter deixado minha cidade natal, que a minha voz ainda ecoava naquele lugar onde costumava cantar todo fim de semana. Que triste e doce ouvi-lo dizer isso. Será que ecoa mesmo? Será que eu ecôo por aí, por lugares que passei e vi mas que nunca mais visitarei? Será que a minha existência, depois que eu deixar esse mundo, vai ecoar por ele como algum sinal cósmico e latente de que eu existi? É seguir em frente pra sentir saudade, como lamentou Camelo¹. Terão que morrer as velhas décadas, anos, meses, dias, horas, segundos, pra que se siga a jornada. Mas que triste é não poder descer do trem do tempo! Só menos triste é acreditar que um dia ele chega ao seu destino, e que ele é belo.




¹Marcelo Camelo, na letra da canção Janta

sábado, março 10, 2012

✽ Despedida

Meu benzinho
Vem aqui pertinho
Pra eu contar pra você
Que eu vou embora
Daqui.

Amorzinho,
Chega de mansinho
Pra não doer o peito
De te deixar
Pra trás.

Mas vou e volto pra você,
Como a onda que foge do mar
E vem passear na maré
Volto de mansinho pra você.

Não dá muito e volto, amor
Que sozinha eu fico triste sem saber
Se chego devagarinho pra você.

Segue a contar os dias, amor
Que eu vou e volto num pé
Quando o vento da vida quiser.